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segunda-feira, 26 de março de 2007

Estupro

Naquele exato momento em que fui penetrada, minha vida tola e casual, morria ali, foi como se meu abdômen ficasse exposto pelo rápido passar de um sabre, uma dor tão profunda, sentida somente pelas pessoas que sofreram grandes traições: não falo de uma simples traição amorosa, dos casamentos mofados e amalgamados pelo talvez e o quem sabe; cito as grandes traições: como a que sofreu César quando foi assassinado por um complô no qual Marco Bruto fazia parte, ou a que sofreu Jesus ao ser delatado por Judas. Esse tipo de traição é tão devastadora que nos faz de um segundo para o outro mudar de devotos ardentes da paz pregada pelas religiões, para adoradores da ira salutar, da vingança digestiva que é cultivada pelo demônio. Cinco horas da tarde, numa alegria profana, entramos no carro <>, exultantes pela tão esperada viagem para o merecido descanso depois de alguns meses de trabalho árduo. No carro, eu, meu esposo, e meu cachorro vira-latas, muito dócil, que nos acompanhava em todas as viagens e passeios.Na realidade, o local escolhido não era muito distante de nossa casa, hora e meia de viagem e pronto, estrada que era maravilhosa por se tratar de uma rodovia ecológica (mata atlântica); árvores se dobravam por toda estrada durante quase todo o percurso; flores nativas, além de bromélias, orquídeas, samambaias gigantescas, com um odor que mesclava entre o perfume das flores, e mato orvalhado. A estrada em certos pontos, ficava perigosa por causa da irresponsabilidade e pressa dos condutores obcecados por ultrapassagens perigosas, isso tornava o passeio um tanto tenso, sempre com surpresas desagradáveis pelo caminho: como animais silvestres esmagados no asfalto, e alguns remanescentes de caminhões tombados. Dobramos numa estrada de terra exatamente uma hora após a saída; o perigo se finda, o cheiro da mata tomava por completo todos os sentidos do corpo, o restaurador barulho de água que escorregava com pressa pelas pedras desenhadas conforme a variação da temperatura, do tempo. Um cenário realmente bucólico.A pousada era simples, porém muito aconchegante, os chalés eram ''doces'', a porta se abria de frente para cama de alvenaria, em cima desta, duas toalhas de banho, duas de rosto, dois roupões de banho, quatro confortáveis travesseiros (tudo branco); um edredom muito fofo com uma estampa miúda de folhas com tons verdes, paredes bem pintada de cor verde água, o chão era revestido com piso frio, havia tapetes em tons pastel, com costuras e detalhes verdes, um quadro horrível na parede com um Catamarã a Vela pintado a óleo, e os dizeres ''sweet home ''; janela de madeira num tom de verde escuro. Em frente à entrada de cada um, havia uma varanda e nela mesa e cadeiras, pertinho da porta, para as pessoas conversarem, petiscarem, ou jogarem baralho sem precisar se afastar do mesmo. O banheiro era simples, com uma ducha muito gostosa, um espelho grande na parede, uns quadrinhos da paisagem local, sabonetes em formato de concha , estrela, lua, pasta de dente e escovas devidamente lacradas em suas embalagens originais. Como chegamos já era noite, e um friozinho enganador arrepiava nossos corpos, arrumamos as coisas das malas, e fomos para a cozinha (fora dos aposentos, claro). Uma agradável cozinha toda equipada, com mil tipos de temperos e apetrechos tudo bem caseiro e aconchegante, uma mesa enorme para dar um ar de ''jantar em família'' .Ainda um tanto tímidos, nós ocupamos às ultimas cadeiras, e fomos recebidos com sorrisos e hospitalidade . No geral as pessoas falavam baixo, com moderação (havia no local somente mais uns dois casais com filhos e um casal idoso), nos foi servido primeiro um chá, depois o que quiséssemos. A comida não era variada, mas era deliciosa, com sabor de roça e fogão à lenha (frango ao molho de maracujá, arroz com cenoura, e uma farta salada).Voltamos para o chalé, alimentei meu cachorro, que depois deixei que passeasse solto pela proximidade (sem perdê-lo de vista), para que ele conhecesse o local.Ficamos jogando cartas, e antes de dormir ainda chupamos algumas laranjas que foram descascadas com uma faca enorme (de mateiro), que levávamos sempre que íamos para a mata para o acaso de uma emergência. No dia seguinte, tomamos café com moderação para não nos empanturrarmos, e fomos caminhar, passar pelo camping; nele havia uma lanchonete, e a pessoa que cuidava do local, um homem magro, alto, trinta e cinco anos aproximadamente, cabelo castanho escuro, barba por fazer, me olhou de maneira ardilosa, com uma gula que dava para sentir a invasão de suas mãos escorregando pela minha pele e passando pelos meus seios. Senti um arrepio, calafrio, comentei com meu esposo, e claro, continuamos.O passeio, estava delicioso, seguimos uma trilha que adentrava a mata, subindo o morro ainda úmido pelo orvalho, que a cada passo parecia mais íngreme, contudo estávamos com a convicção de vencê-lo, pois queríamos alcançar o topo ''careca'', pelo fato de acredito eu, alguns dias anteriores, os responsáveis pelas torres que passam os cabos de alta tensão, terem ido fazer manutenção.Meu cachorro era o mais desanimado, quase se arrastava para nos acompanhar, com uma preguiça somente permitida aos deuses; quando de repente, um cachorro, chamado Negão, que habitava a Pousada, passa por nós com uma ligeireza ... ''humilhando a todos''. Voltamos cansados e famintos, tomamos suco, comemos fruta para aguardar o almoço, ainda demos algumas voltas ao redor do lago, e uma hora depois fomos tomar banho para almoçar . Empanturramos-nos de comida: suculenta, deliciosa, cheirosa, maliciosamente insinuante. Fomos descansar na rede.Estávamos naquele lugar, porque queríamos realmente descansar, entrar em sintonia com a natureza para nos readequarmos a ela.No meio da tarde, resolvemos passear até a cachoeira, que ficava um pouco distante, e apesar da temperatura pois já era final de outono, eu resolvi me banhar, apesar d'água estar bem gelada. Porém não havia levado traje apropriado naquele momento, apenas estava com uma blusa de manga comprida; então retirei o shorts, e como não havia ninguém nas proximidades entrei assim, somente de calcinha. Meu esposo ficou vigiando o caminho, e eu pretendia ser breve. Estava fazendo algumas brincadeiras insinuantes e maliciosas para meu marido, quando senti que alguém mais nos observava apesar de não ter avistado ninguém; resolvi sair e me vestir. Quando estávamos voltando, o tal rapaz que cuidava da lanchonete passou por nós; entre nós dois, me fitou com aquele olhar malicioso, e esfregou a língua entre os lábios.Para não arrumar confusão, me calei, mas fiquei assustada. Na noite que começava um pouco mais fria que a anterior, com chuva forte, nos deitamos mais cedo para aquecer nossos corpos já mornos pelos beijos e abraços por culpa do sugestivo friozinho. Lá pelas dez horas, serviam chocolate quente, chá, café e uns pãezinhos caseiros, quem quisesse comer no quarto ou chalé, teria que buscá-los. Então como meu esposo estava faminto, ele se trocou e foi pegar as guloseimas. Fiquei no quarto com meu cachorro que dormia ao pé da cama em meio a um edredom . Estava de bruços na cama, e de costas para porta lendo, escutei-a se abrir lentamente:— Já?Não obtive resposta então perguntei novamente:— Já?Virei meu corpo. Não era meu esposo, sentei-me rapidamente, e com o movimento brusco, meu cachorro que era muito pacato começou a latir, tudo muito rápido; eu imediatamente senti meu corpo congelar, era o rapaz da lanchonete:— Faça-o ficar quieto ou ele morre!O rapaz estava armado com um revólver trinta e oito; colocou o cano da arma na minha cabeça, tudo isso em segundos, minha boca secara completamente, meus olhos estavam arregalados, minha temperatura havia despencado, minhas mãos, meu corpo havia congelado: disse quase sussurrando:— Olha, não faça nada, por favor, meu esposo já vai chegar;— Eu sei, e assim que ele entrar por aquela porta, eu o mato!— Por favor, não, olha, faça o que quiser, mas não mate ninguém, não vai adiantar.Eu não sabia o que argumentar, minha mente se esvaziara; ele era a representação viva de todos os medos, todos os pavores: naquele momento parado em minha frente, a reprodução do mal, do demônio, que até então era um ser camarada, que caminhava lado a lado comigo durante todos os dias de minha vida, mas nunca mostrara sua face. Naquele momento não, era a hora de nos conhecermos de sermos apresentados. Eu sabia que iria sofrer, que algo terrível iria acontecer e que não poderia fazer nada; não me mexia, estava apavorada, mas não demonstrava, tentava manter um final de dignidade. Se eu gritasse, estaria colocando em risco a vida de quem tentasse me acudir, e isso era também terrível. Eu naquela fração de segundos pesava hipóteses, e mais rezava para o meu esposo não abrir aquela porta. Ele rapidamente desabotoara a calça, e a desceu. Aquele pênis nojento, aquela face desesperada por sentir um minuto de prazer, da posse proibida, de poder ao terminar olhar para face da vitima, e com a satisfação estampada no nariz, na boca, no olhar, na testa, poder ter o falso sentimento de poder, de ser o comandante da vida.A porta se abre novamente, o barulho da chuva torrencial, com trovões e relâmpagos iluminando a noite fechando o sinistro quadro de terror:— Nossa, que chuva ! (bate a porta chacoalha o guarda-chuva, e coloca a bandeja na mesa).— Não! Gritei em vão... um tiro acertou o abdômen de meu esposo.Eu engatinhei pela cama desesperada, ele mal sabia o que estava acontecendo, segurava a barriga, o sangue não parava, tudo tão rápido, tão rápido, meu cachorro latia, se dirigiu até meu esposo que estava com os olhos arregalados: já no chão, tão assustado, tentou esboçar alguma reação, em vão. Sinto um puxão forte em meu cabelo, era o assassino frio, que estava no meu quarto, que arrebentara naquele momento minha vida. Olhei para ele, lhe fitei os olhos com ira, e disse:— Vai ter de me matar também, porque senão vou até o inferno atrás de você. Não sei se foram palavras bem colocadas para o momento, mas era exatamente o que eu sentia, já não tinha mais medo, nem tampouco pânico, nem mesmo frio, meu corpo queimava de ódio, ódio!Ele me jogou na cama , terminou de abaixar as calças, e começou seu ato animalesco, sua representação de superioridade, de força, que por si só já era falsa, afinal a força ali era sua arma.Fiquei de atravessado na cama, com a cabeça para fora, olhei para o chão e vi a faca que havíamos usado para descascar as laranjas. De súbito, deixei que meus braços pendessem para trás insinuando um suposto relaxamento, sua arma estava apontada para minha garganta, bem próxima, praticamente encostada. Se eu fizesse um movimento mais brusco, ele atiraria, alias, ele iria atirar de qualquer maneira, ele precisava me matar, porque não podia deixar testemunha do que havia feito.Calculei que para eu agir, deveria esperar com que ele relaxasse um pouco, para que eu não me arriscasse tanto, e isso queria dizer que deveria esperá-lo gozar. Eu não estava mais ali; meus pensamentos não estavam mais ligados ao meu corpo, nem almenos conseguia senti-lo, seu ato animalesco só pertencia a ele, minha mente não estava naquele momento ligada ao ato em si, somente numa maneira de me manter viva, não queria morrer, e precisava salvar meu esposo, se ainda restasse vida naquele corpo em meio a tanto sangue; meus olhos estavam tão abertos, quanto às portas do inferno, eu virava a cabeça via à faca, do outro lado meu esposo. Apesar de tudo, eu consegui raciocinar e esperar o melhor momento: a arma engatilhada no meu pescoço, a faca já entre meus dedos. Só a espera dos segundos certos para que eu pudesse agir, eu consegui calcular, esperar...Olhei profundamente nos olhos de quem naquele momento me caçava, neste instante eu não só o via, mas também o sentia, de sua boca escorria saliva, ele babava de prazer estava se saciando, saciando sua fome, seus desejos. Procurei sentir seu pênis, porque era meu momento, minha vez de caçar, o momento exato de usar meus instintos, minha astúcia, e de preza indefesa, virar uma caçadora experiente. E foi nos pequenos gestos, nos segundos restantes de minha vida, (porque assim que ele gozasse, me mataria) que encontrei a força, a fórmula para escapar . Fechei meus olhos, senti seu pênis inchar, senti sua mão peçonhenta pressionando meu seio <> e com todo ódio que eu estava sentindo, bati com a faca na horizontal no pescoço daquele ser. Consegui praticamente decepar sua cabeça, e não é exagero, tirei (agora com nojo), rapidamente aquele corpo de cima de mim e corri para ajudar meu esposo. Hoje não sei, não sei o que sinto, porém não consigo ter raiva de Deus, poderia culpá-lo da minha desgraça, geralmente quando acontece algo terrível, seja uma doença, ou um acidente , o culpamos pela SUA falta. Também não consigo escutar os risos do Diabo. Porém, a satisfação que tive ao ver aquele corpo estendido no chão: nem Deus me tira, e nem o Diabo é capaz de proporcionar um prazer maior.Deve ser a mesma coisa que um soldado sente assim que termina uma guerra, um misto de alivio, e dor, uma sensação de dever cumprido sem culpa por ter matado, e ao mesmo tempo uma culpa enorme por não ser capaz de entender o porquê foi obrigado a praticar tal ato. Parece que caminho em silêncio interno sempre. É como se eu andasse na direção oposta as pessoas, ao mundo, tenho a impressão que toda essa gana, volúpia que as pessoas têm de sentir ou fazer algo grande, de nunca, jamais estarem satisfeitas com a própria sorte, essa ''dor'', eu não sinto mais. Sozinha sempre. Ou melhor, com meu cachorro que foi observador do ato, e que por incrível que pareça, anda sempre entremeado entre minhas pernas. Assustado.Silêncio.

escrito por: Ayla Sayf

Um comentário:

Luiz disse...

Bem convincente! Porém não significa que tenha sido verdade. Afinal, se uma vítima dessa natureza fez tal descrição (superminuciosa) com as próprias palavras, presume-se que não se importaria que a mesma história (embora sem riqueza de detalhes), tivesse sido veiculada pela TV. Só que eu não em lembro de ter visto nada do tipo. Observei também que o nome da autora do conto (se não for fictício) não é comum. Parece ser estrangeiro (o que serviria como bom argumento para justificar o fato de não ter se divulgado o caso na imprensa nacional). E, caso, seja verdade, perdoem minha desconfiança. Afinal, convenhamos... não é tão fácil acreditar em qualquer coisa que vemos na Internet. E deixo meu e-mail pra quem quiser fazer mais algum comentário ou mesmo só pra me xingar pelo meu ceticismo. --> lclmaciel@yahoo.com.br